quinta-feira, 28 de abril de 2011

O inato e o adquirido: questões relativas à altura dos goleiros.


 
A grande qualidade que atualmente se exige dos goleiros de futebol de alto nível é o potencial genético principalmente referente à altura, Alcides Scaglia cita bem em seu artigo com mesmo nome do título acima.


“Um grande potencial genético pode não ser tão inteligente quanto uma pessoa que, até apresenta certas restrições potenciais, porém sabe aproveitar o que o ambiente lhe proporciona, demonstrando maior capacidade de adaptação, logo, segundo a lógica da seleção natural a sobrevivência vital ou social sempre estará do lado daquele com maior potencial adaptativo (e não genético).


Algumas equipes, no seu processo seletivo, estão exigindo certa altura para que o candidato a goleiro tenha chance de ser avaliado.

Ilustrativamente, seria como estabelecer uma altura X, fixar um barbante no batente da porta do vestiário dos testes e se o candidato não se abaixar para passar não precisa nem se trocar, pode ir embora, pois já está eliminado.

É incrível como o futebol tem o poder de simplificar as coisas. O quanto ele, e as pessoas que estão nele envolvidas, faz do complexo uma coisa simples, limitada à causa e efeito. Para o futebol não existem um número ilimitado de variáveis, não há espaço para o caos, para a desordem, para o heterodoxo. Ou é, ou não é. Ou é alto, logo goleiro, ou então vai ser treinador de goleiros, ou mesmo, torcedor frustrado.

E o que é pior ainda, as pessoas passam a acreditar que isto é verdade, que é assim mesmo. Operam com a lógica infantil, parecendo-lhes óbvio o fato que quanto maior o goleiro melhor (já que o gol no futebol é grande).

Resumindo: ordem e progresso; tamanho equivalente à qualidade; altura qualifica um goleiro e, ao mesmo tempo, acaba com qualquer possibilidade de um fora da curva sequer arriscar.

Desse modo, se 1,90m é a altura do barbante, quem tem 1,89m nunca servirá, é um produto fora das especificações do mercado. As justificativas são as mais óbvias do mundo: "A Europa exige jogador alto e forte", contra-argumenta os tradicionais e conservadores dirigentes, agentes, técnicos da atualidade. "Se o goleiro for baixo, bola rasteira pode encobri-lo", atormenta o torcedor de arquibancada, e até alguns desavisados jornalistas.

Neste caso o inato sobrepõe o adquirido. Primeiro seja alto, depois se der aprenda a ser goleiro. Se não for possível aprender, não tem importância, sendo alto você já é goleiro. Não é isso que vemos nas equipes hoje em dia? E nas categorias de base, então?

Será que em vez de altura, o maior pré-requisito para o goleiro não seria aprender a ler o jogo? Se assim o fizesse, simplesmente a sua colocação evitaria inúmeras quedas. Também evitaria a necessidade de se ter uma altura determinante, pois não seria cinco centímetros a mais ou a menos que fariam a diferença para evitar o gol, mas sim, novamente, a colocação, a velocidade de reação, a força, o potencial de impulsão, o controle emocional...

Mas aí temos um problema. Quantos treinadores sabem ensinar seus goleiros a ler o jogo? Como se poderia fazer isto na prática? Como ensinar a cair menos sem parecer que o goleiro não treinou? Como ensinar/treinar o goleiro a ficar atento no jogo, sendo que, na maioria das vezes, é o jogador que menos pega na bola no jogo (sendo o que mais se movimenta e pega na bola no treino)?

Não será impondo uma limitação biológica para os goleiros, que se formará bom jogadores nesta posição. A formação de um goleiro começa na formação de seu treinador de goleiro. Se este não for intuitivo (digo intuitivo porque existe muito pouca literatura específica sobre treinamento de goleiros), se este não for sabedor das causas e objetivos dos diferentes projetos, muito pouca coisa fará.

Portanto, no papel cinco centímetros fazem a diferença, mas no campo, principalmente para quem já desempenhou a função com inteligência, sabe que estes centímetros são irrelevantes.

A maior virtude de um goleiro é invisível aos olhos. As qualidades psicológicas são infinitamente mais determinantes e importantes para selecionar um bom goleiro. Contudo, estas qualidades (adquiridas) não são necessariamente mensuradas e aparentes, exigem um olhar atento, próximo, experiente, sensível e sapiente. “E o que é mais importante, este olhar pode ser formado pela ciência (mas não pela faculdade empírica da bola)”.

Realmente, deve-se focar na formação dos profissionais que vão treinar os goleiros, que atualmente ainda está sendo um trabalho em sua maioria por ex-goleiros que não procuraram investir em uma formação mais ampla, o futebol não pode ser tão simplificado de forma a limitar em selecionar os atletas somente pela altura, como também os treinamentos não devem ser somente uma replica que treinadores já tiveram quando atletas, pela sua importância no futebol os goleiros merecem um foco maior e uma melhora no contexto de conhecimento científico.

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